Todo mundo tem um louco. Geralmente morador de rua, anormal, excluído socialmente, que de alguma forma meche no seu âmago em algum momento do seu dia. Eu havia esquecido o meu. Mas Edgard Navarro fez o favor de me lembrar que ele existiu, quando lançou o filme “Eu me lembro”.
O meu era homem. Um João louco. Lembro-me quando era pequena e minha avó me levava à casa dos meus primos para brincar, enquanto ela fofocava com a irmã. No meio do caminho tinha um louco que dizia que eu era filha dele. Eu simplesmente o odiava. Ele era grande, barrigudo, desdentado e... Louco. Toda vez que me via armava a maior festa e dizia com todo fervor “minha filha!”. Só deus sabe o quanto desejei seu sumiço.
Daí, um belo dia, ele sumiu... E caiu no meu baú de infância. Nunca mais me lembrei daquele ser diferente que sabe-se lá porque, identificava em mim alguma filiação. Loucura total. Nunca senti falta dele, sentia mesmo era um desconforto, revolta, por ele ousar a se achar meu pai. Roubar o lugar do meu genitor, referência principal para mim na época.
Devo confessar, de vez em nunca me recordava dele, deitado no passeio em frente á uma padaria de lajotas vermelhas. Sem camisa, cabelos emaranhados, descalços e com aquele ar outside que só os loucos têm. Entretanto, antes de cair no esquecimento definitivo, quando completei uns 15 anos ele reapareceu. Um pouco mais velho, cabelos brancos, mas com a barriga enorme de sempre. Eu estava passando com a minha avó pelo mesmo local da época infantil, quando ele gritou “MINHA FILHAA!” abrindo os braços com o maior sorriso amarelo desdentado. (ele não esperava que eu fosse abraçá-lo né?) Creio que ele só me “reconheceu” por causa da minha avó, que não muda a aparência nunca. Ou talvez, até tenha se lembrado de mim, sei lá.
Ás vezes me questiono se sou tão louca quanto ele, pois, até hoje sinto aquele desconforto idiota de repugnância com o homem. Um ultraje mesmo. Esse fato impregnou tanto no meu ser, que me pergunto se não fui filha dele em alguma encarnação. Talvez tenha sido mesmo, num mundo em que só ele entendia e onde só ele me via, porque eu, o terei sempre como o homem feio, sujo, fedorento e louco, que dormia num passeio em frente a uma padaria que já não existe mais.
nossa.
ResponderExcluirnão cultive o ódio.
cultive o amor!
Teka, você escreve muito bem. Vejo seu relato quase como uma crônica. Exercite esse potencial, pode ser bem interessante. Como nosso assunto é arte, vamos aproveitar todas as possibilidades existentes, como também criar oportunidades, para transformar nosso trabalho (seja ele de casa ou de classe) em criação artística ou análise, reflexão artística. No viés da linguagem você mostrou propriedade. Aproveite então.
ResponderExcluirBjs
Ivani
AAhh vim aqui re-postar o texto porque achei umas coisas que poderíam ser mudadas, mas, já que teve comentários... o deixarei assim =)
ResponderExcluirNti, não tem ódio no meu texto. tem uma essência infantil adormecida que foi incapaz de compreender a loucura daquele homem, só isso.
Pense que se trata de alguem, com oito anos de idade, passeando feliz a cantar com sua avó, e de repente, um doido pula na sua frente e grita "minha filhaa!"
o que eu poderia pensar?
1 - sou adotada?
2 - sou filha desse homem feio e fedorento?
3 - pq ninguem me contou isso?
4 - eu nao gosto dele.
sem ódio, só paz =)
Vlw Prof ^^
ResponderExcluirAdoro quando me dão estimulo =)
Isso me revigora xD
pensei que o texto não era mais seu :P
ResponderExcluiracho que eu eu naõ entendi o que a autora quis dizer ;)
erhm... o texto é meu =/
ResponderExcluirboiei =)